António Santos
Lemos em Casa
A Rapariga que Roubava Livros
de Markus Zusak (Ed. Presença)
por Francisca Teixeira, 9.º E
Markus Zusak é um escritor australiano autor de vários livros: O Azarão, o seu primeiro livro, O Mensageiro, O Construtor de Pontes e A rapariga que roubava livros, que é um dos seus livros mais conhecidos e uma obra bastante envolvente e marcante.
A história deste livro decorre durante a Segunda Guerra Mundial quando uma jovem chamada Liesel Meminger, uma rapariga simples e inteligente que vive com os seus pais adotivos na Alemanha, desenvolve o hábito de “roubar” livros para ler ao seu amigo Max, um judeu que morava clandestinamente em sua casa. Rudy, o melhor amigo de Liesel, é outra das personagens notáveis desta obra, que a acompanha nas suas aventuras e desventuras.
Seguimos a história da pequena Liesel através da Morte, a narradora omnipresente, que, cansada de recolher almas, observa com compaixão e fascínio a estranha natureza dos humanos. A Morte transporta-nos para os típicos momentos de pânico vividos nesta época, em que os bombardeamentos eram frequentes, até que, um dia, a rua onde Liesel morava foi atingida sem nenhum aviso prévio. Terá Liesel sobrevivido?
Fiquei muito admirada logo no início com a narradora da história que, ao longo do livro, por vezes também é uma personagem: a Morte.
O que mais me fascinou neste livro foi a perspetiva em que a história nos é contada, ou seja, a perspetiva dos alemães comuns, provando que nem todos os alemães eram nazis ou se identificavam com a ideologia. Se muitos idolatravam Hitler e eram nazis convictos, muitos outros faziam o que era esperado deles para evitar represálias e alguns, ainda, como o pai adotivo de Liesel, recusaram até ao fim renunciar à sua humanidade e arriscaram a própria vida para ajudar os que não tinham qualquer esperança.
Este livro assalta-nos e vence-nos com as relações de compreensão, afeto, partilha e cumplicidade entre Liesel e Hans, “o pai”, e entre ela e o seu amigo judeu Max, num contexto tão precário e forçosamente silencioso.
Para concluir, gostaria de dizer que gostei muito de ler este livro. A Rapariga que roubava livros é uma obra estritamente bem conseguida e trabalhada, rica em pormenores que demonstram o ambiente pavoroso vivido numa época de guerra e que, apesar de toda esta tristeza relatada, o escritor consegue, através de Liesel, dar-nos momentos de humanidade, carinho e amizade.
XVII Concurso de Fotografia
1.º Classificado
Beatriz Menino, 12.º C
Lemos em Casa
Última Paragem Auschwitz: como sobreviver ao horror 1943-1945
de Eddy de Wind (Planeta)
por Margarida Sousa, 9.º E
O livro é um testemunho de um médico judeu que sobreviveu a Auschwitz. Esteve lá durante mais de 2 anos, o mesmo tempo que a sua esposa, que foi a maior força para sobreviver. Neste livro, conta como passou os seus dias. Por ser médico, teve bastantes privilégios, destacando-se o acesso a uma maior quantidade de comida e o facto de não ter de trabalhar nas piores brigadas, o que o ajudou a manter a esperança de voltar a ter uma vida normal.
Na minha opinião, é um bom livro, bem escrito, com uma mensagem passada, com sucesso, aos leitores. Identifico pontos positivos na obra mas, também, alguns negativos.
Como pontos positivos, identifico a boa escrita, a fácil leitura e o facto de o autor ter estado com homens e mulheres de todas as brigadas, o que lhe permitiu descrever a vida no campo de concentração, dando a conhecer aos leitores as atividades aí praticadas e a vida no campo, de forma pormenorizada e chocante.
Como aspetos negativos, identifiquei dois. O primeiro está ligado com o facto de muitas palavras se encontrarem em alemão, como no original. A sua tradução apenas é referida da primeira vez em que a palavra aparece. Quando a mesma palavra aparece mais à frente, muitas das vezes, já não sabemos qual o seu significado, tornando a compreensão mais difícil. O outro ponto que considerei menos bom é um aspeto relacionado com a minha interpretação e mais pessoal. O subtítulo do livro é “como sobrevivi ao horror de 1943 a 1945” e, pela leitura do mesmo, pensei que a obra estivesse escrita na primeira pessoa, o que, na minha opinião, teria mais impacto.
Para concluir, considero que o livro de que acabei de falar é um bom livro para conhecer a vida durante a época do Holocausto, com mais pontos positivos do que negativos. Sendo assim, é uma leitura que recomendo a todos, sobretudo aos mais interessados pelo tema da 2ª Guerra Mundial.
XVIII Concurso de Conto
1.º Classificado
Diogo Heleno, 12.º B
Livro Segundo
«Benedixitque illis Deus et ait crescite et multiplicamini et replete terram et subicite eam et dominamini piscibus maris et volatilibus cæli et universis animantibus quæ moventur super terram»[1]
«Ó Senhor, eu sou Voss[a] serv[a], sim, Voss[a] serv[a] e filh[a] de Vossa escrava. Quebrastes as minhas cadeias; sacrificar-Vos-ei uma vítima de louvor»[2]. Meu Amor por Vós é aderente e tomado de tal tenacidade que resiste a qualquer tentativa de rutura. Quebrem-se-me as tíbias, ó meu Deus, para que não possa mais andar. Arranquem-se-me as maxilas, ó meu Deus, para que não possa mais falar. Perfurem-se-me as veias, ó meu Deus, para que não possa mais existir. E nesta falta de andamento e de fala e de existência, habito em Vós e por Vós me encho de júbilo. Ouvi agora benignamente esta prédica que a Vós se dirige, porque a ignomínia não se esgotou no que já disse, antes jaz putrescente nesta minh’alma sequiosa de imaculabilidade.
Prosseguirei, pois, com as minhas húmiles Confissões. E neste momento de resolução, tacteio o meu coração e lhe reconheço o Amor fecundo por Nosso Senhor Jesus Cristo em cada uma das suas fibras. Tangei-mas, ó meu Deus, neste instante de mortificação cavada até ao âmago pelágico desta minha essência, e fazei delas suave melodia que desperte os Homens deste malfadado sono e os restitua à vigília, tal qual David, que tangendo, por seu turno, sua lira, expurgava Saúl de seus malignos espíritos. Que eu seja Vossa lira e que o canto que dela emane seja pleno de complacência e Vos louve segundo a Vossa imensidão, grandiosamente, com tamanha veemência que supere em intensão a de todas as canoras trombetas, sonoros címbalos, ressonantes saltérios, cítaras, frautas, sinos, aulos, tambores! Um grito de aleluia expedido ao mais elevado firmamento!
Dest’arte, iniciarei minha confidência. Por Vós guiada fui até à longínqua Nicomédia, penitenciando durante a longa peregrinação, na tentativa de fazer luzir da minha comorbidade clareira imensa que me livrasse da vérmina de que padecia. E, ó meu Deus!, quanto Vos agradece esta Vossa serva por nunca me faltardes, mesmo naquelas asfixiantes e calcinadoras Horas Sextas de verão! Orava perseverantemente, pelas folhagens desfalecidas, pelas crespas sarças, ásperos cardos e abrolhais, pelos arbustos que inclinavam as sumidades ante o Sol férvido, rememorando-me dos Vossos mistérios e da paixão de Cristo, apropriando-me da fogosidade do astro e transformando-a em fogosidade religiosa. E nesses momentos de êxtase, olhando a espaços aquilo que me circunscrevia, não eram rochedos, nem arroios, nem boninas o que tão comoventemente observava, mas sim obras de Deus, obras Vossas, penetradas pela Vossa claridade!
Só então compreendi quão parasíticos são os Homens, e eu, meu Deus, e eu! Pois quê? É que dissestes ao dia sexto que o Homem dominasse as restantes criaturas, mas não seria esse domínio para ser praticado da mesma forma com que nos dominais, caridosa e benevolentemente? Disse Jesus: iam non dico vos servos quia servus nescit quid facit dominus eius vos autem dixi amicos quia omnia quaecumque audivi a Patre meo nota feci vobis[3]. Se assim é, não deveria o Homem agir perante a Vossa Criação exercendo domínio amical, zeloso em desbastar as ramudas cepas e lhes conservar os pedúnculos cárpeos, em vez de consumir essa mesma cepa? Sim, porque os Homens não se saciam com os carpos somente, senão que devoram tudo o que lhe surja, os pedúnculos, as hastes, as estirpes, a seiva, os seixos, o que os rodeia, e o que mais além se figura. Devoram o horto, a leiva inteira, o latifúndio e tudo o que lhes é menor e subordinado, os currais, os terreiros, os eirados, as varas, rebanhos, cardumes, os próprios hortelões, rendeiros, granjeiros! Devoram tudo e os da própria qualidade. E de todo este férculo orgíaco, é o mesmo Homem que, ébrio, repousa num encosto, eructando ruidosamente, regurgita a matéria putrefacta, sente-lhe o acre sulfúrico, a emanação excrementícia, os glóbulos pastosos por digerir cuja configuração tão prazerosamente se demora em adivinhar serpejando a língua pelo palato, carcomido pelos ácidos e pelos vermes que se locomovem em espasmos, mais perturbados pela repugnante atmosfera fecal em que nadam que o dono daquela boca, que agora desperta deste enlevo (um fedor lhe atiçou a glutonia), sonda o mento peludo, encontra uma falange olvidada, observa-a como que intentando se lembrar a quem já pertencera, perde-se no pensamento, já não lhe importa, esgravata com a unha agarrada àquele osso os dentes imundos que ainda retém, rói o restante, e num ímpeto fulminante de ânimo e glória, num derrame de gáudio supremo, levanta-se e, ah meu Deus!, ergue as mãos aos céus, profere «Abençoai este alimento que tomo» e engole tudo, empurrando aquele visco até às entranhas sedentas! Afasta-se sem tardança daquele local (para o mais comum dos observadores nada acontecera), espera-o nova refeição, que isto é gente de muito alimento.
Isto, meu Deus, é a verdadeira gula! A dos que não têm verdadeira boca!, porque verdadeira é aquela que profere o Verbo, espargindo a Palavra do Senhor e fazendo-o à Vossa semelhança! Não mais que cavidades distópicas são aquelas que proferem a repulsa e estabelecem o domínio por soberba subordinação dos corpos que só a Vós pertencem, autêntica emulação de cecos.
E eu, meu Deus, eu sou implicada!, porque quando descasco um aromático pomo ou uma doce laranja, ao lhe tirar esses invólucros e essas túnicas orgânicas, faço-o desinteressada e precipitadamente como se fosse condição imanente daqueles frutos o terem sido criados para meu proveito e divididos convenientemente em gomos para mais fácil ser o seu consumo. Mas facilis est descensus averni[4], fácil é trilhar o caminho do mal. Não será aquela minha atitude um princípio para atitudes mais graves e mais abjetas, meu Deus? Tal qual quando sacudimos um qualquer inseto alado que nos incomode, quando calcamos as lâminas das ervas rasteiras, isso não será a causa primeva para o Homem manipular as Vossas criaturas como se a ele pertencessem? Não será isto a causa das gaiolas, das cadeias, das piozes, das trelas, dos jugos, das esporas?
Não digo que objetos tais sejam perdição, mas a intenção, meu Deus, a intenção com que os manuseiam é que encerra a vil baixeza – a de o Homem tudo querer devorar, (de novo) desinteressada e precipitadamente. E o mais miserável, o mais pungente, é que o que o mesmo Homem traga mais frequentemente, e num só gole, são outros Homens, outros a que não me refiro nestas Confissões, porque imerecedores de repreensão, porque flébeis e, ainda assim, humildes e temerosos a Vós – os mais puros cristãos, os únicos a que é digno atribuir tal designação.
De todo o modo, enfermidades do ventre, boca, intestinos e coisas que tais estão sob o ministério de Santo Erasmo, ou São Elmo (como aprouver ao freguês), sempre em frente, direita.
Mas ó meu Deus!, eu Vos peço, ó Criador do Céu e da Terra, mitigai esta minha dor, lenificai esta minha perversão, pois pensei ter senhorio deste pó e destas lágrimas e deste mundo à vista e, por isso, os usei sem a morabeza com que Vós me criastes e a todas as coisas! Animai-me de confiança, porque não me reconheço em Luzia, pois me parece que luzir nunca fui capaz! Ó meu Deus, santificai estes ossos, estes humores, estes olhos, este ventre!… Diga? Desculpe? Ah, muito bem, deixe só… Muito bem, pode dizer… nove, cinco, um, cinco, zero, oito, zero, três… repita só o último, se faz favor…um? Muito bem… Diga-me só uma coisa, Elmo leva H?
[1] «E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e subjugai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra» (Genesis, 1:28)
[2] Salm. CXV, 16-17
[3] «Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; chamo-vos amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos dei a conhecer» (João, 15:15)
[4] Virgílio, Eneida, VI, 126.
Revista de Ciência Elementar
O novo número, em formato digital, já está disponível aqui, em http://be.age-mgpoente.pt/index.php
I Concurso Uma História em Imagem(s)
Proposta a ilustração de um excerto da narrativa “Hélia, a filha do sol”, disponível em https://drive.google.com/file/d/1iorh2U0z5ilW6-EzjdQoRLP1RPMlynK3/view?usp=sharing, a grande vencedora foi a imagem abaixo, da autoria de
Beatriz Paulo, 9.º A
A história completa poderá ser lida em https://drive.google.com/file/d/1CR2fxH_nFkEzcZtXKjkTcV0Y18Ug1w2Y/view?usp=sharing